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Em 2011, perdi a oportunidade de ver de perto um dos meus artistas preferidos de todos os tempos. Prince faria um show aqui no Rio, no Back2Black, mas o descumprimento por parte dos organizadores de uma exigência contratual do cantor (ter um palco exclusivo) resultou no cancelamento da sua participação no festival. Além de ser fã das músicas do cara, sempre o considerei um mestre da presença de palco, um artista que sabia como poucos conduzir um espetáculo. A leitura da biografia Prince: inside the music and the masks, porém, mostrou-me que ele teve que vencer o medo da ribalta para se tornar o showman que encantaria o mundo.

Sua carreira começou quando a Warner resolveu apostar no garoto que, com apenas 19 anos, era capaz de, literalmente, gravar um disco sozinho. Prince foi descoberto por Chris Moon, músico e dono do estúdio Moon Sound, na sua Mineápolis natal. Trabalhando para Moon, o garoto muitas vezes passava as noites e os fins de semana no estúdio, para escapar dos problemas de relacionamento com o pai e a mãe, à época já separados. O “rato de estúdio” em poucas semanas passou a dominar não só vários instrumentos, como também as técnicas de gravação. Não raramente, Moon deixava com Prince, no fim do dia, uma demo tosca, com um vocal e um violão gravados, para chegar na manhã seguinte e encontrar uma faixa pronta, com vários instrumentos.

Em 1977, Moon ajudou Prince a gravar uma demo com 14 canções e apresentou-o como “o novo Stevie Wonder” para o empresário Owen Husney, que conseguiu um contrato com a Warner Bros. Records. Mais interessada no prodígio do multi-instrumentista do que na arte de Prince em si, o selo milagrosamente concordou em deixá-lo, aos 19 anos, produzir sozinho seu primeiro disco, ‘For You’ (1978), gravando todos os vocais e tocando 27 instrumentos diferentes.

Prince gravou todos os vocais e os 27 instrumentos usados no seu disco de estreia

Em 1980, com ‘For You’ e ‘Prince’ (1979) nas lojas, o músico já tinha provado que brincava com as técnicas vocais, tocava inúmeros instrumentos e dominava todos os recursos de um estúdio de gravação, mas os shows não refletiam a potência da sua música. O temor de participar de uma longa turnê acabaria sendo vencido de forma traumática, com a ajuda de um professor nada ortodoxo.

Rick James era “o cara” do funk americano. Egresso da The Stone City Band, o artista da Motown tinha acabado de lançar o terceiro disco de uma sólida carreira solo, ‘Fire It Up’, que superaria um milhão de cópias vendidas. Há muito, James estava de olho em Prince, que considerava um artista extremamente talentoso, mas ainda incapaz de fazer sombra abrindo para a sua banda numa turnê nacional pelos EUA.

Prince foi submetido a um batismo de fogo, com 38 shows em nove semanas. No início, houve uma certa hostilidade por parte do público de James, mas pouco a pouco o jogo virou, e o brilho do novato começou a ofuscar a atração principal. Episódios de bullying viraram uma constante. Certa vez, Rick insistiu para que Prince fosse à celebração dos seus 32 anos. Exausto, o garoto declinou, mas, diante da insistência, chegou à festa dizendo que não iria beber. Só não contava que James, 25cm mais alto, forçaria-o a virar um copão de conhaque. Humilhado, Prince deixou o recinto, mas logo depois fez as pazes com o mestre, com quem tinha uma relação de amor e ódio.

Prince sofreu nas mãos de Rick James

A cereja do bolo veio após o fim da turnê. De volta a Mineápolis, Prince estava dando um confere nos seus pertences, quando sentiu falta de seus sintetizadores. Depois de procurar por todos os lados, em vão, eis que o equipamento chegou na sua casa pelos correios, junto com um cartão postal de Sausalito, Califórnia. Era Rick James agradecendo pelo “empréstimo”. Com os sintetizadores de Prince, ele tinha acabado de gravar o que seria o seu disco mais bem-sucedido, ‘Street Songs’, com a clássica ‘Superfreak’.

Pouco mais de um ano depois, Prince viveria outra experiência traumática. Em setembro de 1981, sairia ‘Controversy’, seu quarto disco. Enquanto planejava a turnê, o artista ficou exultante ao saber que uma de suas bandas preferidas, os Rolling Stones, queriam que ele abrisse os shows deles nos Estados Unidos. Dez Dickerson, guitarrista e amigo de infância de Prince, alertou que a mistura poderia ser perigosa.

Encarar 110 mil roqueiros vestido assim é coragem ou loucura?

Já no primeiro show, no Los Angeles Memorial Coliseum, o baterista Bobby Z percebeu o tamanho da roubada. “Quando vi aqueles caras que estavam desde às seis da manhã esperando pelos Stones, a maioria com pinta de motoqueiros, todos no pico das drogas e bebidas que tinham tomado o dia todo, tentei avisar que ia dar m…”. Prince, vestido apenas de paletó, cueca e sapatos de salto alto pretos, abriu com ‘Uptown’, e a resposta da plateia foi rude. Ele ainda tentou mudar o setlist, priorizando as músicas mais pesadas, esticando os solos de guitarra, além de evitar os tradicionais gritos estridentes e falsetes, mas a hostilidade não diminuiu. O show durou 25 longos minutos.

Mick Jagger convenceu Prince a fazer uma nova tentativa no dia seguinte, no mesmo local, mas o resultado foi ainda mais desastroso. O recém-contratado baixista Mark Brown, de 18 anos, fazia o segundo show da sua carreira, diante de 110 mil pessoas, quando garrafas começaram a voar em direção ao palco. Uma laranja acertou as cordas de seu instrumento. Prince abandonou o palco, jurando jamais voltar a abrir para qualquer artista.

O episódio traumático deu forças para Prince abraçar sua primeira grande turnê nacional, a Controversy Tour, com 61 shows lotados em cinco meses. Em quase quarenta anos de carreira, foram sete Grammys, quarenta discos de estúdio gravados, mais de 150 milhões de cópias vendidas e uma legião de fãs encantados com as suas performances em todo o mundo.

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